Meditação


Às vezes, quando a noite vem caindo,
Tranquilamente, sossegadamente,
Encosto-me à janela e vou seguindo
A curva melancólica do Poente.

Não quero a luz acesa. Na penumbra,
Pensa-se mais e pensa-se melhor.
A luz magoa os olhos e deslumbra,
E eu quero ver em mim, ó meu amor!

Para fazer exame de consciência
Quero silêncio, paz, recolhimento
Pois só assim, durante a tua ausência,
Consigo libertar o pensamento.

Procuro então aniquilar em mim,
A nefasta influência que domina
Os meus nervos cansados; mas por fim,
Reconheço que amar-te é minha sina.

Longe de ti atrevo-me a pensar
Nesse estranho rigor que me acorrenta:
E tenho a sensação do alto mar,
Numa noite selvagem de tormenta.

Tens no olhar magia de profeta
Que sabe ler no céu, no mar, nas brasas...
Adivinhas... Serei a borboleta
Que vendo a luz deixa queimar as asas.

No entanto — vê lá tu!— Eu não lamento
Esta vontade que se impõe à minha...
Nem me revolto cedo ao encantamento...
— Escrava que não soube ser Rainha!

Fernanda de Castro

6 comentários:

Rogério G.V. Pereira disse...

Todos somos como ela
Pensamos melhor
Debruçados sobre a janela
(desde que aberta)

Eva Gonçalves disse...

Revejo-me totalmente nesse poema que escolheste... totalmente! :) Beijo

Eliete disse...

Helga, fazia tempo que não passava por aqui e muito me alegrou com a delicadeza e beleza deste poema.bjs

Anónimo disse...

Belíssimo poema, Helga, com uma fotografia muito apropriada.

Brown Eyes disse...

Lindo poema. Eu facilmente mergulho em mim esteja onde estiver. Aliás a minha distracção vem dessa facilidade, quando dou conta já cá não estou. Beijinhos

Fê blue bird disse...

Meditei e encontrei-me neste lindo poema de Fernanda de Castro.
O blogue está lindo!

beijinhos