Manjericos de Santo António {reposição}


Manjericos de Santo António
Versos que a vida leva e trás
Só queria que no meu
O tempo pudesse voltar atrás

Aos meus anos de menina e moça
Em que Alfama era luz e cor
A noite era criança
E as promessas eram de amor

Nos bailes e arraiais
Arranjar noivo não era para mim
Só queria ser livre e jovem
E continuar a dançar assim

Subir ao Castelo era da praxe
Com os amigos reunidos
Todos os becos eram paragens
Até os mais esquecidos

Manjericos de Santo António
Versos que a vida leva e trás
Só queria que no meu
O tempo pudesse voltar atrás

Helga Piçarra

Um Pequeno Grande Passo



Atrevi-me e arrisquei tudo no desafio da editora Lua de Marfim para esta obra de poesia de autores lusófonos "POEMA-ME". Ainda bem que o fiz, pois a sensação de ver as minhas palavras publicadas é indescritível. Sempre fui muito tímida em partilhar o que escrevo e acho sempre que podia fazer melhor, por isso agradeço à Lua de Marfim o voto de confiança ao ter apostado em mim. Obrigada! Obrigada também a vocês, que me leram ao longo dos dias em que por aqui ando. Foi apoiada nas vossas palavras de carinho e incentivo que resolvi arregaçar as mangas e perder a timidez. Quem sabe não me atrevo um pouco mais? O importante é dar o primeiro passo, certo? 

Aproveito para informar que o nome do autor do poema publicado, é o meu verdadeiro nome.

Não me Sinto Só


Não me sinto só nesta apatia das palavras. 
Nesta ausência de inspiração constante e colectiva. 
Nesta languidez que me entorpece o corpo e me adormece a mente. 
Não me sinto só nesta ânsia de respirar livremente a frescura dos dias, 
sem que o nó que me sufoca, me sufoque. 
Sinto-me parte integrante de uma multidão de espíritos cansados e oprimidos, 
vencidos pelo seu próprio medo e revolta. 
Não me sinto sozinha, mas oxalá estivesse. 
Oxalá a maioria de nós conseguisse vencer esta letargia.


Texto deSofia Azevedo (um pseudónimo de mim)

O Tempo Não Pára




Eu sei
Que a vida tem pressa
Que tudo aconteça
Sem que a gente peça
Eu sei

Eu sei
Que o tempo não pára
O tempo é coisa rara
E a gente só repara
Quando ele já passou

Não sei se andei depressa demais
Mas sei, que algum sorriso eu perdi
Vou pedir ao tempo que me dê mais tempo
Para olhar para ti
De agora em diante, não serei distante
Eu vou estar aqui

Cantei
Cantei a saudade
Da minha cidade
E até com vaidade
Cantei
Andei pelo mundo fora
E não via a hora
De voltar p'ra ti

Não sei se andei depressa demais
Mas sei, que algum sorriso eu perdi
Vou pedir ao tempo que me dê mais tempo
Para olhar para ti
De agora em diante, não serei distante
Eu vou estar aqui


(Miguel Gameiro)

Julgamento de Valores


Um casal mudou-se para um novo bairro. Na manhã do dia seguinte, enquanto tomavam o café da manhã, a mulher olhou pela janela e viu a sua vizinha a estender a roupa. Imediatamente ela comentou com o marido: “As roupas não estão limpas, os nossos vizinhos não sabem lavar a roupa, quem sabe eles não precisam de um sabão melhor.”
Durante um mês eles comentaram sobre as roupas sujas dos vizinhos. Até que um dia a mulher olhou pela janela e viu a sua vizinha estender as roupas impecavelmente limpas.
Então ela disse ao marido: “Os nossos vizinhos finalmente aprenderam a lavar a roupa, vê como estão limpas! Quem será que os ensinou?”
O marido respondeu: “Minha querida, na verdade fui eu que acordei mais cedo hoje e limpei a nossa janela.”
Assim é a vida: Aquilo que vemos quando olhamos os outros depende de quão limpas estejam as janelas através das quais olhamos. Antes de criticar e procurar algo nos outros para julgar, quem sabe não seja melhor perguntar se não estamos prontos para um novo olhar.

Roubado do FACEBOOK. Desconheço o autor.

Simples assim...



"Como uma criança antes de a ensinarem a ser grande, 
Fui verdadeiro e leal ao que vi e ouvi."

Alberto Caeiro, in "Fragmentos" 

Voar com as Aves

Este poema foi-me apresentado pelo meu filho que completa hoje 14 anos. Li-o de olhar humedecido mas com um sorriso na alma. Ver um filho crescer e lentamente ganhar as suas próprias asas, acorda-nos para o outro lado do maravilhoso mundo que é ser mãe. O lado em que vê-los voar é tão belo quanto vê-los crescer, porque sim, o voo é inevitável.


POEMA À MÃE

No mais fundo de ti, eu sei que traí, mãe.
Tudo porque já não sou o menino adormecido no fundo dos teus olhos.
Tudo porque tu ignoras que há leitos onde o frio não se demora
e noites rumorosas de águas matinais.

Por isso, às vezes, as palavras que te digo são duras, mãe,
e o nosso amor é infeliz.
Tudo porque perdi as rosas brancas que apertava junto ao coração
no retrato da moldura.
Se soubesses como ainda amo as rosas,
talvez não enchesses as horas de pesadelos.

Mas tu esqueceste muita coisa;
esqueceste que as minhas pernas cresceram, que todo o meu corpo cresceu,
e até o meu coração ficou enorme, mãe!

Olha - queres ouvir-me? -
às vezes ainda sou o menino que adormeceu nos teus olhos;
ainda aperto contra o coração rosas tão brancas como as que tens na moldura;
ainda oiço a tua voz:
Era uma vez uma princesa no meio de um laranjal...

Mas - tu sabes - a noite é enorme, e todo o meu corpo cresceu.
Eu saí da moldura, dei às aves os meus olhos a beber.
Não me esqueci de nada, mãe.
Guardo a tua voz dentro de mim.
E deixo-te as rosas.

Boa noite. Eu vou com as aves.

Eugénio de Andrade in «Os Amantes Sem Dinheiro» (1950)

Sensibilidade [a minha]


Intrigam-me, num sentido literal e quase assustador, as pessoas que não se deslumbram com uma simples flor do campo, com uma folha de Outono ou com uma mera gota de chuva. Intrigam-me as pessoas que não se emocionam com um filme, com um livro, ou simplesmente com um anúncio de televisão. As pessoas que não se sensibilizam com a doçura dos animais ou com a inocência das crianças. Entristece-me descobrir que cada vez mais estou rodeada de pessoas que não param para apreciar o céu ou ouvir o vento. Tenho consciência que não somos todos iguais, nem tão pouco temos que gostar das mesmas coisas. Aliás, nem poderia ser assim, o mundo tombaria num instante. Mas confesso que por vezes me sinto um pouco incompreendida no meu "excesso" de sensibilidade, e talvez por isso me esforce por tentar compreender e aceitar a falta dela nos outros. Tenho de o fazer, mas quando não consigo, apoio-me na ideia de que nos compensamos mutuamente com a partilha de opiniões e a troca de emoções. A minha sensibilidade é a minha força e não peço desculpa por isso, porque no fim, o que realmente importa é o que nos faz sorrir e o que nos aquece o coração. Se há quem prefira não sentir os pequenos e simples detalhes da vida, é uma opção à qual tem todo o direito.

Helga Piçarra

É Urgente Sermos Mais HUMANOS


Abram os olhos. Somos umas bestas. No mau sentido. Somos primitivos. Somos primários. Por nossa causa corre um oceano de sangue todos os dias. Não é auscultando todos os nossos instintos ou encorajando a nossa natureza biológica a manifestar-se que conseguiremos afastar-nos da crueza da nossa condição. É lendo Platão. E construindo pontes suspensas. É tendo insónias. É desenvolvendo paranóias, conceitos filosóficos, poemas, desequilíbrios neuroquímicos insanáveis, frisos de portas, birras de amor, grafismos, sistemas políticos, receitas de bacalhau, pormenores. 

É engraçado como cada época se foi considerando «de charneira» ao longo da história. A pretensão de se ser definitivo, a arrogância de ser «o último», a vaidade de se ser futuro é, há milénios, a mesmíssima cantiga. Temos de ser mais humanos. Reconhecer que somos as bestas que somos e arrependermo-nos disso. Temos de nos reduzir à nossa miserável insensibilidade, à pobreza dos nossos meios de entendimento e explicação, à brutalidade imperdoável dos nossos actos. O nosso pé foge-nos para o chinelo porque ainda não se acostumou a prender-se aos troncos das árvores, quanto mais habituar-se a usar sapato. 

A única atitude verdadeiramente civilizada é a fraqueza, a curiosidade, o desespero, a experiência, o amor desinteressado, a ansiedade artística, a sensação de vazio, a fé em Deus, o sentimento de impotência, o sentir-mo-nos pequeninos, a confissão da ignorância, o susto da solidão, a esperança nos outros, o respeito pelo tempo e a bênção que é uma pessoa sentir-se perdida e poder andar às aranhas, à procura daquela ideia, daquela casa, daquela pessoa que já sabe de antemão que nunca há-de encontrar. O progresso é uma parvoíce. Pelo menos enquanto continuarmos a ser os animais que somos. 

Miguel Esteves Cardoso, in 'Explicações de Português'

Decisões


Admiro as pessoas que assumem sem receio o controlo da sua própria vida. Pessoas que confiam nas suas próprias decisões. Tomar a decisão certa no momento certo, pode mudar uma série de acontecimentos que aconteceriam de uma outra forma apenas por se tomar a decisão errada. Mas como saber o que é certo ou errado num determinado momento? Como escolher as palavras e as acções que poderão determinar o nosso presente e influenciar o nosso futuro? Muitos diriam que por instinto. Talvez sim, talvez não. Há pessoas que arriscam mesmo quando sabem que as hipóteses de falhar são maiores do que as hipóteses de acertar. Afinal de contas falhar é nada mais que a oportunidade de fazer de novo, mas melhor. Quem não arrisca não erra e quem não erra não aprende. Somos um ciclo interminável de opções e possibilidades. Na verdade saber escolher o momento certo é um talento que todos possuímos, porém apenas alguns de nós têm a capacidade de usufruir do direito à opção de escolha sem recear as suas consequências. Serei eu uma dessas pessoas? Gosto de pensar que estou no caminho certo para fazer as escolhas que me darão a oportunidade de continuar a aprender com os meus erros. Acima de tudo quero assumir o controlo da minha vida e determinar o meu presente sem temer as consequências do meu futuro. E tu? Confias nas tuas próprias decisões?

Helga Piçarra

A Mulher


Ó Mulher! Como és fraca e como és forte
Como sabes ser doce e desgraçada
Como sabes fingir quando em teu peito
A tua alma se estorce amargurada

Quantas morrem saudosa duma imagem
 Adorada que amaram doidamente
Quantas e quantas almas endoidecem
Enquanto a boca rir alegremente

Quanta paixão e amor às vezes têm
Sem nunca o confessarem a ninguém
Doce alma de dor e sofrimento
Paixão que faria a felicidade dum rei
Amor de sonho e de saudade
 Que se esvai e que foge num lamento

Florbela Espanca 

Do Virtual ao Real


Hoje publico aqui algo um pouco fora do âmbito habitual, mas não podia deixar de partilhar este acontecimento que me enche de um enorme orgulho. O que não passava de um hobby de fim-de-semana, tornou-se em algo maior. Um sonho tornado realidade. Falo do meu marido, que viu finalmente o seu talento reconhecido enquanto designer de skins para carros virtuais. Agora o primeiro carro real com design inteiramente de sua autoria aqui está, um Ferrari 458 GTD, que irá correr amanhã ao vivo e a cores nas 24h de Daytona. Aqui ficam algumas imagens do resultado final... e digam lá que não ficou uma verdadeira beleza? Estou tão orgulhosa!

É da Praxe


Na Lusófona há meninos trajados como abutres que impedem colegas seus de falar com jornalistas. Nem quero saber se as mortes do Meco se ficaram a dever a um ritual idiota de humilhação e vassalagem; escolho deprimir-me antes com esta omertà manhosa que visa encobrir a vergonha, exorcizar a culpa, proteger a amada "tradição". 

Mas fazem bem, os meninos das capitas grotescas. Fazem bem em acalentar as praxes universitárias. Elas são, afinal, a melhor formação a que os nossos filhos se podem sujeitar; treino para viver num país em que a obediência redime, a cabeça baixa salva e a submissão leva à vitória.
Como na tropa, as praxes preparam para o campo de batalha. E para a obediência cega aos mais graduados. Mesmo que as ordens venham de alguém que só tem a sua burrice, a capacidade de chumbar resmas de anos como galões. Passando no teste, as vítimas poderão um dia, oh suprema felicidade!, vir a oprimir os seus próprios recrutas. 

Os meninos que mais aprendem com desfiles em trajes menores e excrementos besuntados na cara ficam prontos para altos voos. Prontos, por exemplo, para serem deputados de um partido que os obriga a votar de forma abjecta, contra a sua consciência. E nem sentem vergonha: proclamam ridículas declarações de voto com o ar contrito de soldados que se sacrificaram pelo bem do pelotão. Eles não queriam, ela até fugiu na hora H... mas nenhum ousa abandonar o "grupo" que os pôs a votar contra a decência que neles ainda sobrevive. Foram bem treinados. 

Um texto de Luís Rainha, o qual subscrevo e assino cada linha.

Amor Comum

Este ano os U2 ganharam o Golden Globe pela melhor música original (Ordinary Love) e Bono Vox dedicou-o a Nelson Mandela, um homem que escolheu não odiar, não porque não sentisse ódio ou raiva, mas por achar que o amor faria um trabalho melhor. Bonito, não?


We can't fall any further
If we can't feel ordinary love
We cannot reach any higher
If we can't deal with ordinary love

Seremos fortes o suficiente para lidar com o amor comum?
Mandela foi.

A Casa da Assenta


A casa da Assenta é um lugar encantado. Um mistério arrancado das páginas de um romance enigmático e inspirador. Aqui tudo é paz e serenidade. Até o mar bravio que fustiga a extensa falésia com a sua revolta, nos tranquiliza e acalma o espírito com a fúria da sua melodiosa imponência. O sopro do vento traz até nós um cheiro de vida e de sal. Uma brisa marinha que se dissolve suavemente, devolvendo no eco do seu silêncio, a essência de todos os seus mistérios à imensidão do mar. Sólida e plantada no topo das rochas, como se de rochas fosse feita, a casa da Assenta é hospitaleira e acolhedora como um terno abraço. Nostálgica como uma tarde de Inverno e solarenga como uma manhã de Verão.
Aqui o medo é levado pela espuma da maré e as dúvidas pelo sabor do vento. Aqui os dias passam devagar e as noites são como um bálsamo que nos acaricia a alma. Aqui a saudade só é grande na hora de ir embora, quando percorremos a sinuosa estrada de terra batida e vemos as suas paredes caiadas de branco fundirem-se no horizonte, como as asas de uma gaivota, cujo voo nos acompanha até perdermos o velho casario de vista, e sentimos imediatamente vontade de voltar, porque a casa da Assenta é um lugar encantado, onde tudo é paz e serenidade. Um lugar onde nos desejamos encontrar apenas para nos voltarmos a perder na calmaria dos seus segredos e nos deixarmos conquistar pelos seus aromas exóticos e apaziguadores.


Helga, in Lugares Imaginados

Eusébio (1942 - 2014)

Tive o prazer e o privilégio de o conhecer na década de 80. Homem humilde e de grande simpatia. Nunca o vi jogar, mas cresci a ouvir os relatos dos seus feitos e das suas glórias. Na última homenagem "sentiu-se" a ausência de Mourinho e Ronaldo. Descansa em paz grande Pantera Negra!


Havia nele a máxima tensão
Como um clássico ordenava a própria força, 
sabia a contenção e era explosão, 
havia nele o touro e havia a corça.

Não era só instinto, era ciência,
magia e teoria já só prática.
Havia nele a arte e a inteligência
do puro jogo e sua matemática.

Buscava o golo mais que golo: só palavra.
Abstracção. Ponto no espaço. Teorema.
Despido do supérfluo rematava
e então não era golo: era poema.

Manuel Alegre

Eu tive um Sonho, sonhei a Paz


Era um sonho branco, branco como a Paz
Era um sonho de ouro, de ouro como a luz
 Era um sonho imenso que envolvia todos os espaços
Era um sonho vivo feito de mãos dadas e de abraços

E li no meu sonho a palavra Esperança
Ouvi no meu sonho risos de Criança
 E era a Verdade a única lei da nossa voz
 E era a Amizade a regra de vida entre nós

E os que acreditaram quando eram meninos
No poder das fadas traçando os destinos
Sabem que este sonho não está nas varinhas de condão
Sabem que este sonho começa no nosso coração

(Canções de Natal)

Votos de Feliz Natal

Transformação Pessoal


A transformação pessoal não é uma corrida contra o tempo. Na realidade, por vezes, quanto mais nos esforçamos por mudar, mais moroso é esse processo. São inúmeras as pessoas que abordam o processo em que se descobrem a si mesmas como se fosse um desporto radical – apressando-se em busca do que remediará todos os seus males, a um passo frenético. Lêem livro após livro; consultam uma sucessão ilimitada de conselheiros e assistem a uma infinidade de seminários. Querem respostas para as grandes questões com que se debatem. Contudo, uma pessoa que não seja capaz de manter a serenidade face ao mistério da sua vida, desfrutando do processo de desenvolvimento pessoal, viverá constantemente amedrontada.
Robin Sharma, in Inspiração 
Texto transcrito a propósito do desafio de Fevereiro da Fábrica de Letras "Metamorfose".

2 Anos!


Mais um ano passou e com este já são dois que este blogue completa. É instintivo dizer-se que nunca pensámos chegar tão longe, mas na verdade para mim é surpreendente. Sem inspiração e sem saber o que dizer ou comentar, ultimamente este espaço tem sido um espaço vazio de conteúdo e de qualquer tipo de expressividade. Provavelmente já aconteceu a todos, aliás, tenho para mim que sim, que nem sempre apetece dizer alguma coisa. Não sei se pedir desculpa pela minha falta de vontade será o mais adequado, porém sinto-me na obrigação de o fazer, por isso e como que em forma de justificação, me desculpo perante vós, a razão pela qual este espaço ainda existe, pela ausência e pelo quase abandono do mesmo. Desculpem, sim? E muito obrigada pelo carinho, pela partilha e pela companhia!

Canção de Dezembro


There was always Christmas time
To wipe the year away
I guess that morning they’d decided
That the war would have to wait
There was always Christmas time
Jesus came to stay
I could believe in peace on Earth
And I could watch TV all day
So I dreamed of Christmas

Votos de um Feliz Natal

Povo



 "Um povo imbecilizado e resignado, humilde e macambúzio, fatalista e sonâmbulo, burro de carga, besta de nora, aguentando pauladas, sacos de vergonhas, feixes de misérias, sem uma rebelião, um mostrar de dentes, a energia dum coice, pois que nem já com as orelhas é capaz de sacudir as moscas..."

Guerra Junqueiro, in "Pátria", escrito em 1896

Chuva


Chuva, caindo tão mansa
Na paisagem do momento
Trazes mais esta lembrança
De profundo isolamento

Chuva, caindo em silêncio
Na tarde, sem claridade
A meu sonhar d'hoje, vence-o
Uma infinita saudade

Chuva, caindo tão mansa
Em branda serenidade
Hoje minh'alma descansa.
— Que perfeita intimidade!

Francisco Bugalho

Somos um Pilar


Somos um pilar. Forte e indestrutível. Sólido como uma rocha. Aguentamos tempestades, aturamos demências, consolamos tristezas, perdoamos ofensas e no final do dia sorrimos. Sorrimos porque nos habituámos a sorrir perante as adversidades. Sorrimos porque é a única forma de as vencer. Habituámo-nos a ser fortes. Habituámos os outros à nossa força. Porém um dia, sem razão aparente, não conseguimos sorrir. Não conseguimos ser fortes. Choramos por tudo e choramos por nada. As demências dos outros aborrecem-nos e as ofensas magoam-nos. Precisamos de um abraço. De um sorriso. De uma palavra de conforto e compreensão. Mas somos um pilar. Forte e indestrutível. Sólido como uma rocha. Somos culpados. Habituámos os outros à nossa força e nunca à nossa fraqueza. Lidamos com as fraquezas de todos e no entanto ninguém sabe lidar com as nossas. Desconhecem-nas. Esperam que sejamos fortes como sempre fomos. Que nos ergamos sozinhos. É o que fazemos. É no auge da nossa angústia que reconstruímos o nosso pilar.  É no meio dos destroços que se ergue a nossa força. Precisamos dela. Para consolar quem não nos consola. Para compreender quem não nos compreende. Precisamos de continuar com a farsa em que todos acreditam. Incluindo nós...

Helga

da Ausência


"Para quem ama, não será a ausência a mais certa, a mais eficaz, a mais intensa, a mais indestrutível, a mais fiel das presenças ?" 
Marcel Proust

Detonadores


"- Como vê, todos temos no nosso interior os elementos necessários para produzir fósforo. Mais ainda, deixe-me dizer-lhe uma coisa que não confiei ainda a ninguém. A minha avó tinha uma teoria muito interessante, dizia que embora todos nasçamos com uma caixa de fósforos no nosso interior, não os podemos acender sozinhos, precisamos, como na experiência que acabei de fazer, de oxigénio e da ajuda de uma vela. Só que neste caso o oxigénio tem de vir, por exemplo, do hálito da pessoa amada. A vela pode ser qualquer tipo de alimento, música, carícia, palavra ou som que faça disparar o detonador e assim acender um dos fósforos. Por momentos sentir-nos-emos deslumbrados por uma intensa emoção. Dar-se-á no nosso interior um agradável calor que irá desaparecendo pouco a pouco conforme passa o tempo, até vir uma nova explosão que o reavive. Cada pessoa tem de descobrir quais são os seus detonadores para poder viver, pois a combustão que se dá quando um deles se acende é que alimenta a alma de energia. Por outras palavras, esta combustão é o seu alimento. Se uma pessoa não descobre a tempo quais são os seus próprios detonadores, a caixa de fósforos fica húmida e já não poderemos acender um único fósforo. Se isso chegar a acontecer, a alma foge do nosso corpo, caminha errante pelas trevas mais profundas procurando em vão encontrar alimento sozinha, não sabendo que só o corpo que deixou inerme, cheio de frio, é o único que poderia dar-lho."

Passagem do livro Como Água Para Chocolate de Laura Esquivel, que estou a reler. Não resisti à simplicidade desta teoria e à sua veracidade.

Perguntas sem Resposta


"Se é verdade que apenas podemos viver uma pequena parte daquilo que em nós existe, então o que acontece ao resto?"

Pascal Mercier em "Comboio Nocturno para Lisboa"

200 Anos

 D. Antónia Ferreira (1811 - 2011)

Se podia viver sem o Vinho do Porto? Poder, podia, mas não seria a mesma coisa... gosto tanto:)
Abençoada seja D. Antónia.

Meditação


Às vezes, quando a noite vem caindo,
Tranquilamente, sossegadamente,
Encosto-me à janela e vou seguindo
A curva melancólica do Poente.

Não quero a luz acesa. Na penumbra,
Pensa-se mais e pensa-se melhor.
A luz magoa os olhos e deslumbra,
E eu quero ver em mim, ó meu amor!

Para fazer exame de consciência
Quero silêncio, paz, recolhimento
Pois só assim, durante a tua ausência,
Consigo libertar o pensamento.

Procuro então aniquilar em mim,
A nefasta influência que domina
Os meus nervos cansados; mas por fim,
Reconheço que amar-te é minha sina.

Longe de ti atrevo-me a pensar
Nesse estranho rigor que me acorrenta:
E tenho a sensação do alto mar,
Numa noite selvagem de tormenta.

Tens no olhar magia de profeta
Que sabe ler no céu, no mar, nas brasas...
Adivinhas... Serei a borboleta
Que vendo a luz deixa queimar as asas.

No entanto — vê lá tu!— Eu não lamento
Esta vontade que se impõe à minha...
Nem me revolto cedo ao encantamento...
— Escrava que não soube ser Rainha!

Fernanda de Castro

da Condição Humana

 
Todos sofremos.
O mesmo ferro oculto nos rasga e nos estilhaça a carne exposta.
O mesmo sal nos queima os olhos vivos.
Em todos dorme a humanidade que nos foi imposta.
Onde nos encontramos, divergimos.
É por sermos iguais que nos esquecemos,
Que foi do mesmo sangue,
Que foi do mesmo ventre que surgimos.


Ary dos Santos

Carrego o Teu Coração Comigo


Carrego o teu coração comigo
Carrego-o no meu coração
Nunca estou sem ele
Onde eu vou, tu vais
E o que é feito por mim, és tu que fazes
Não receio nenhum destino
Tu és o meu destino
Eu não quero outro mundo
Tu és o meu mundo, a minha verdade
Tu és o significado da Lua
Onde quer que o Sol brilhe, tu és o seu canto

Aqui está o segredo mais profundo que ninguém sabe
Aqui está a raiz da raiz e o botão do botão
E o céu do céu de uma árvore chamada vida
A qual cresce mais alto
Do que a alma espera ou a mente esconde
Este é o milagre que mantém as estrelas separadas
Carrego o teu coração comigo
Carrego-o no meu coração

E.E. Cummings

O Poder das Nossas Escolhas



Coisas ruins não são o pior que pode nos acontecer. O pior que nos pode acontecer é NADA. Uma vida fácil nada nos ensina. No fim, é o que aprendemos o que importa: o que aprendemos e como nos desenvolvemos. Traçamos as nossas vidas pelo poder das nossas escolhas. Quando  as nossas escolhas são feitas passivamente, quando não somos nós mesmos que traçamos as nossas vidas, sentimo-nos frustrados.

Uma pequena mudança hoje pode acarretar-nos um amanhã profundamente diferente. São grandes as recompensas para aqueles que têm a coragem de mudar, mas essas recompensas acham-se ocultas pelo tempo. Geramos os nossos próprios meios. Obtemos exactamente aquilo pelo que lutamos. Somos responsáveis pela vida que nó próprios criamos. Quem terá a culpa, a quem cabe o louvor, senão a nós mesmos? Quem pode mudar as nossas vidas, a qualquer tempo, senão nós mesmos?


Richard Bach

Metade


Que a força do medo que tenho
Não me impeça de ver o que anseio
Que a morte de tudo em que acredito
Não me tape os ouvidos e a boca
Porque metade de mim é o que eu grito
Mas a outra metade é silêncio.

Que a música que ouço ao longe
Seja linda ainda que tristeza
Que a mulher que eu amo seja pra sempre amada
Mesmo que distante
Porque metade de mim é partida
Mas a outra metade é saudade.

Que as palavras que eu falo
Não sejam ouvidas como prece e nem repetidas com fervor
Apenas respeitadas
Como a única coisa que resta a um homem inundado de sentimentos
Porque metade de mim é o que ouço
Mas a outra metade é o que calo.

Que essa minha vontade de ir embora
Se transforme na calma e na paz que eu mereço
Que essa tensão que me corrói por dentro seja um dia recompensada
Que o espelho reflita em meu rosto um doce sorriso
Que eu me lembro ter dado na infância
Por que metade de mim é a lembrança do que fui
Mas a outra metade eu não sei.

Que não seja preciso mais do que uma simples alegria
Pra me fazer aquietar o espírito
E que o teu silêncio me fale cada vez mais
Porque metade de mim é abrigo
Mas a outra metade é cansaço.

Que a arte nos aponte uma resposta
Mesmo que ela não saiba
E que ninguém a tente complicar
Porque é preciso simplicidade para fazê-la florescer
Porque metade de mim é a plateia
E a outra metade é canção.

E que a minha loucura seja perdoada
Porque metade de mim é amor
E a outra metade também.

Letra e música: Oswaldo Montenegro

A Rosa


Alguns dizem que o amor é um rio
  que afoga a relva macia
Alguns dizem que o amor é um lâmina 
que deixa a tua alma a sangrar

Alguns dizem que o amor é uma fome
Uma necessidade dolorosa que nunca acaba
Eu digo que o amor é uma flor e tu és apenas a semente

É o coração com medo de quebrar que nunca aprende a dançar
É o sonho com medo de acordar que nunca aproveita a chance
É aquele que nunca será dominado que não se consegue dar
  É a alma com medo de morrer que nunca aprende a viver

Quando a noite for solitária e o caminho muito longo
Quando achares que o amor é para os fortes e para os sortudos
Basta lembrares-te que num Inverno distante sob a neve amarga
Está uma semente que com o amor do Sol
Na Primavera se torna numa Rosa

(Bette Midler - The Rose)